Bom dia a todos.
Gostaria de começar por expressar a minha sincera gratidão pelo amável convite que me foi dirigido a mim e ao Supremo Tribunal de Justiça de Portugal para participar nesta reunião de trabalho.
Os meus agradecimentos especiais ao Presidente do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, Marko Bošnjak, e a Ana Maria Guerra Martins, juíza deste Tribunal.
Gostaria também de louvar a excelente iniciativa dos organizadores e agradecer a todos os que se disponibilizaram para discutir connosco temas tão relevantes para a aplicação da lei.
É muito útil ter um diálogo franco e aberto entre o Tribunal Europeu dos Direitos do Humanos (TEDH) e o Supremo Tribunal de Justiça de Portugal (STJ), criando assim um espaço para a troca de ideias e reflexões.
Esta reunião contribuirá para construir um diálogo regular entre as nossas instituições, permitindo-nos aprofundar questões de grande relevância para a proteção dos direitos humanos, tanto no contexto europeu como no contexto nacional.
No cenário atual, é fundamental reconhecer a importância do Sistema Europeu de Direitos Humanos, que tem uma influência significativa no direito português e na jurisprudência dos tribunais portugueses.
Não podemos deixar de sublinhar o papel fundamental da Convenção e das decisões do TEDH na interpretação e aplicação dos direitos humanos em Portugal.
A Constituição da República Portuguesa reconhece que as disposições contidas nas convenções internacionais ratificadas ou aprovadas são vinculativas na ordem jurídica interna, conferindo-lhes, pelo menos, um estatuto supralegal.
E as nossas leis internas estão alinhadas com os princípios estabelecidos pelo Tribunal Europeu, refletindo a integração do direito europeu no ordenamento jurídico português.
Embora, em geral, a Constituição da República Portuguesa e o direito interno correspondam aos princípios da Convenção, existem situações excecionais em que a interpretação, a margem de apreciação e as práticas judiciais a nível nacional podem resultar num incumprimento temporário da jurisprudência do Tribunal Europeu.
Tal pode ocorrer, por exemplo, em domínios como a liberdade de expressão, a proteção da honra e o direito da família.
Quando tal acontece, o diálogo entre os tribunais nacionais e o Tribunal Europeu conduz a uma adaptação gradual da legislação e das práticas judiciais, alinhando o sistema jurídico português pelos princípios da Convenção Europeia.
Por conseguinte, as decisões do Tribunal Europeu têm uma forte influência na interpretação do direito nacional, em especial no que diz respeito à interação com o Supremo Tribunal de Justiça.
A constante análise e adaptação das decisões dos tribunais nacionais à luz dos acórdãos de Estrasburgo são evidentes e fundamentais para assegurar o cumprimento das normas internacionais.
Trata-se de um instrumento interpretativo e evolutivo no âmbito do sistema de proteção dos direitos humanos na Europa.
Desenvolve e interpreta as normas da Convenção, estabelecendo padrões que influenciam as leis e decisões nacionais, assegurando que aquelas são efetivamente aplicadas e respeitadas.
Exerce, assim, um efeito normativo prático em muitos casos, sendo utilizado pelos tribunais nacionais para aplicar as disposições da CEDH de forma mais eficaz.
Por conseguinte, a preocupação com a uniformização da mesma é fundamental.
As decisões do Tribunal Europeu, embora vinculativas para o Estado Parte, não têm efeito anulatório automático da decisão nacional, uma vez que, note-se, não são tomadas pela via ou em sede de recurso.
Não obstante, em determinadas circunstâncias, um tribunal nacional pode, em sede de recurso de revisão, “reformar” decisões cíveis quando a decisão nacional seja inconciliável com a decisão do Tribunal Europeu, garantindo a devida conformidade com os seus compromissos internacionais.
Esta inconciliabilidade não é, porém, automática e pressupõe uma análise casuística.
Dentro das interações mais significativas entre o Tribunal Europeu e os tribunais nacionais destacam-se questões como o direito à honra e à liberdade de expressão, frequentemente analisadas sob a ótica da desconformidade e da condenação.
O equilíbrio entre estes direitos fundamentais exige uma interpretação cautelosa que considere o contexto social e as limitações impostas pela Convenção.
Outro ponto relevante é a questão da adoção.
O TEDH tem atuado no sentido de garantir que os direitos das crianças e das famílias sejam respeitados, especialmente em casos que envolvam violações do direito à família e da criança e às situações que se prendem com um julgamento justo.
Em termos de proteção jurídica, a lei portuguesa disponibiliza diversos instrumentos jurídicos para assegurar a defesa do direito à honra, no âmbito de infrações penais, e para regular matérias relacionadas com a liberdade de expressão.
No que diz respeito à adoção, o ordenamento jurídico português dispõe ainda de um conjunto de disposições que visa garantir o bem-estar das crianças e a conformidade com os princípios da CEDH.
Estas são as questões concretas que trazemos ao debate.
Concluo sublinhando a importância da manutenção de um diálogo permanente entre os tribunais portugueses e o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem.
Por conseguinte, será particularmente importante para nós conhecer as últimas tendências da jurisprudência do Tribunal de Justiça Europeu e as suas orientações interpretativas da Convenção.
Neste âmbito, o Protocolo 16 parece-me ser um instrumento útil para os juízes do Supremo Tribunal de Justiça.
Os pareceres emitidos são um bom instrumento de argumentação jurídica e podem ser decisivos para a conclusão do caso, evitando posteriores queixas em situações em que o Supremo Tribunal de Justiça decida de acordo com o parecer.
Estou convicto que a ratificação do Protocolo 16 por Portugal pode fortalecer a interação a que me referi, constituindo uma ferramenta adicional para assegurar que os direitos fundamentais de todos os cidadãos são devidamente protegidos, tanto a nível nacional quanto europeu.
Desejo a todos um encontro bem-sucedido.
Muito obrigado.
29-11-2024, Estrasburgo
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